quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Por uma Teologia Pop

Essa semana na revista Época (nº 746), a reportagem de capa falava sobre o filósofo suíço Alain de Botton e sua busca por escrever autoajuda com pitadas de filosofia.

O empreendimento, bem interessante por sinal, mostra que o ensino de filósofos das mais variadas épocas e contextos podem ser relevantes para ajudar a solucionar (ou talvez amenizar) os problemas da vida moderna. Temas como dinheiro, sexo, trabalho, era digital, mente sã, mudança do mundo, dentre outros, permeiam o trabalho de Alain, que objetiva trazer reflexões leves e pertinentes, contribuindo para mudanças significativas no dia a dia do homem contemporâneo.

A ideia é facilitar o acesso a sabedoria da filosofia e converte-la em dicas aplicáveis a vida prática das pessoas não "iniciadas" na erudição filosófica.

Ao ler a reportagem fiquei pensando em como seria bom que os pensadores e debatedores de "abobrinhas teológicas", ao invés de discutirem se Deus pode ou não pode alguma coisa, parassem de perder tempo e fizessem o mesmo que o filoósofo suíço, trazendo a "chama de Cristo" para o mundo dos meros mortais. Ou seja, que tal traduzir a teologia e a Bíblia para o contexto palpável do homem comum?

Porque não falar sobre a vida cristã e o dinheiro, o sexo, o trabalho e o descanso, além de outros temas, mas não de forma condenatória ou legalista; mas de uma maneira leve, com conselhos práticos e acima de tudo plausíveis?

Uma das maiores crises que temos hoje é a do púlpito, que está repleto de "falação" erudita, filosofia de "viajar na maionese" e divagações que não contribuem para vida prática de ninguém. Falta objetividade na pregação, o que reflete numa vida cristã vazia.

Outro problema é que muitos cristãos que ainda leem a Bíblia não estão conseguindo transpor a sabedoria ali inserida para a vida real. Isso é uma crise de ensino, mas não pela falta dele, e sim pela ausência de um ensino bíblico que seja vivencial. Ensinam-se muitos conceitos que estão desconectados de qualquer aplicabilidade real.

Alain de Botton, o filósofo pop e ateu, ensina a nós cristãos que o evangelho tem sido desconfigurado em nossos arraiais, pois não há maior fonte de sabedoria de vida do que a palavra de Deus, e se dela não conseguimos extrair o básico para termos uma vida mais leve e plena, é porque ainda não compreendemos o que é transformar a complexidade de um escrito milenar em verdades possíveis para o homem do século XXI.

Que Deus levante profetas que ensinem verdadeiramente o povo a ter vida em abundancia, e que este povo aprenda a encontrar na palavra de Deus fonte de orientação e satisfação para suas vidas.

Que tal propormos uma teologia acessivel? Porque não uma Teologia Pop?

Jorge Luiz.


terça-feira, 28 de agosto de 2012

Quem você convida para sua mesa?

Então Jesus disse ao que o tinha convidado: "Quando você der um banquete ou jantar, não convide seus amigos, irmãos ou parentes, nem seus vizinhos ricos; se o fizer, eles poderão também, por sua vez, convidá-lo, e assim você será recompensado.

Mas, quando der um banquete, convide os pobres, os aleijados, os mancos, e os cegos.
Feliz será você, porque estes não têm como retribuir. A sua recompensa virá na ressurreição dos justos".
Lucas 14:12-14


Pense comigo: Você oferece um jantar com o melhor que tem. Ao final chega um dos convidados e faz uma crítica dessas. O que você sentiria? 

Eu não ofereci nenhum jantar para Jesus, mas a "pancada" deste comentário chega a doer em mim. Como todas as demais afirmações de Jesus, esta consegue incomodar a qualquer um que a lê.

E porque incomoda? Ora, apenas pelo simples fato de que Jesus desmascara as motivações por trás de tudo que fazemos. Nos evangelhos o que você faz não é mais importante do que o motivo pelo qual você faz.

A questão que Jesus destaca é muito maior do que abrir a porta da sua casa para os marginalizados. Ele está a nos desafiar a cultivar um tipo de sentimento positivo por quem não tem nada a nos oferecer. 

Sentimento gratuito não é uma postura natural da nossa humanidade caída. Somos quase que instintivamente movidos a responder positivamente somente àqueles que nos correspondem. É triste constatar que muito do que fazemos já está imbuído, mesmo que inconscientemente, da expectativa do retorno vantajoso. O fariseu que convidou Jesus simplesmente visava uma retribuição de seus colegas que tinham vontade de conhecer o rabino nazareno. No mínimo um próximo jantar na casa de outro aristocrata.

Aprender a agir favoravelmente sem esperar retorno é complicado. Amar gratuitamente é um desafio gigantesco. Mas quem disse que ser cristão é fácil?

Jorge Luiz


sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Para que eu seja leve

Para que eu seja leve, preciso me enxergar, por mais difícil que possa ser.
Porque se enxergar é se avaliar
Mas só olha para si mesmo quem antes aprendeu a se humilhar
E do humilde vem a capacidade de se perdoar.

Para que eu seja leve, preciso me despojar, por mais difícil que possa ser. 
Porque despojar é abandonar.
E abandonar exige renunciar.
Pois quem já renunciou um dia aprendeu a perdoar.

Para que eu seja leve, preciso me resignificar, por mais difícil que possa ser.
Porque se resignificar é se refazer mesmo sem merecer
E para se refazer é necessário acreditar e avançar
Mas só segue em frente quem um dia entendeu
Que para ser leve eu preciso mesmo é me perdoar.


Jorge Luiz

(Não sou poeta e tenho péssima rima. Esse texto é apenas devaneios de quem busca a leveza do ser).


terça-feira, 7 de agosto de 2012

Entre acolher e cuidar

Entre acolher e cuidar existem diferenças. Contudo poucos percebem.
Quem acolhe aproxima o distante com um forte abraço e um olhar terno.
Quem acolhe evita um sorriso amarelo, pois deseja ser sincero.

Mas nem sempre quem acolhe cuida.
Porque cuidar é mais que abraçar, é também se importar.
É não somente saber seu nome, e sim transpor os montes para te encontrar. 

Portanto, quem acolhe apenas pergunta como você está. Já quem cuida lhe percebe além do que aparência deixa mostrar.
Quem acolhe é simpático e expansivo, quem cuida é amoroso e compreensivo.
E quem acolhe limpa as feridas, já quem cuida pode curá-las.


Jorge Luiz

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Conselho do Velho Paulo ao Jovem Timóteo (2Tm)

Procurei ler a 2ª Epístola de Paulo a Timóteo não como uma lista de orientações de um pastor experimentado à um inexperiente, mas como conselhos valiosos para um jovem que deseja servir a Deus com integridade.

Independente do chamado ministerial, em todos nós há uma vocação para seguir e se inspirar em Cristo, o nosso único Senhor. Os conselhos de Paulo a Timóteo se aplicam a todos os seguidores de Cristo.

Dentre as orientações, destaco três que me chamaram a atenção:

Aquilo que fizer, faça por inteiro (2Tm 2.4-7). Nossa época é marcada por jovens que querem "abraçar o mundo" de uma só vez. São tantas atividades que acabamos vivendo com superficialidade. Coração dividido é o caminho para a superficialidade. 

Quer uma vida com mais sentido e profundidade? Pois faça tudo por inteiro. Onde estiver, que não seja pela metade. Aprenda o sentido da palavra comprometimento. Uma vida cristã sem compromisso é apenas perda de tempo. Paulo nos convida ao comprometimento com o evangelho apesar das conseqüências negativas. 

Evite debates infrutíferos e conversas tolas (vs 14-16). No contexto de Paulo para Timóteo, as conversas tolas estão associadas aos falsos ensinos sobre a volta de Cristo. Contudo, hoje há também outras conversas tolas e potencialmente nocivas. Basta dar uma breve olhada nas redes sociais para assistir o festival de "besteirol" e futilidades que cercam os assuntos. Conversas vazias tornam nossas vidas e mentes vazias. Caminhe com sabedoria e mantenha-se em silêncio quando não houver o que falar de bom e louvável. Alimente-se de bom conteúdo, leia bons livros, devore a Bíblia, converse com pessoas que edifique sua vida e sempre procure pensar de que forma você pode edificar e abençoar os outros através de sua fala.

Prefira sempre ensinar à debater. Em um debate as idéias somente se confrontam sem nenhum resultado positivo. Ensinar e aprender já reflete uma relação harmônica, pois quem ensina não quer confrontar, mas com mansidão procura compartilhar, e quem ouve humildemente se deixa ser tocado pelo ensino.

Fé exige convicção (2Tm 3.14-17). É estranho dizer isso, já que a fé não possui amplos dados científicos e empíricos. A fé possui uma lógica que não está atrelada aos princípios da observação científica. Contudo, Paulo afirma que a fé existe no ambiente da convicção, e não da dúvida. Ele chama o jovem Timóteo a reexaminar os fundamentos da fé, que aprendeu com sua familia, mas não para negá-los, mas para aperfeiçoá-los. Quais são os pilares da fé em Cristo que exigem total convicção? Como você interpreta as escrituras a partir da fé em Cristo? Dúvidas e questionamentos só são válidos se, centrado em Cristo, servirem como ferramentas para aperfeiçoar e fortalecer os pilares.

Em suma: Integridade, sabedoria e convicção. São estes os três principais caminho que o velho Paulo ensina ao Jovem Timóteo e a todos nós.


domingo, 29 de julho de 2012

O que a humanidade quer e o que ela precisa ouvir

Hoje li uma reportagem na revista Época sobre um guru nascido no Brasil chamado Prem Baba. Não o conhecia, mas pelo texto da revista ele é famoso e atrai milhares de seguidores (famosos ou anônimos) entre aqueles que buscam os gurus da Índia e suas palestras. A reportagem fala sobre sua caminha de espiritual até chegar ao status de guru espiritual no hinduísmo. 

O que me chamou a atenção na reportagem não foi a história dele, mas uma fala da repórter Aline Ribeiro me chamou a atenção. Transcreverei na integra o texto:

"Não se trata de milagre (os feitos e o ensino do guru). Prem Baba fala o que a humanidade quer ouvir (grifo meu). Acolhe um mundo carente de conforto espiritual. Foge dos padrões das religiões cristãs, como o catolicismo ou protestantismo, segundo as quais Deus observa de binóculo qualquer tropeção aqui embaixo (grifo meu). O pai do amor (significado de Prem Baba) não faz sermão. Não julga. Nunca franze a sobrancelha. Parece sorrir com os olhos ininterruptamente. Tem a voz tão aveludada que é impossível não baixar o tom quando se conversa com ele. Sua missão, diz, é esbanjar o amor desinteressado".

Tirando os exageros e a falta de conhecimento acerca dos cristãos e do seu Deus, esse trecho me conduz a várias reflexões. Como a própria repórter diz, o sucesso do guru está em falar o que a humanidade quer ouvir. E o que a humanidade quer ouvir? Ora, nada mais senão uma mensagem de "amor desinteressado". Mas o que seria o tal "amor desinteressado"? Para entendê-lo, é preciso ver como a repórter descreve o Cristianismo: uma religião julgadora que cultua um Deus neurótico que existe apenas para acusar e castigar as pessoas por seus pecados.

Verdadeiramente a humanidade não quer ouvir falar sobre seus pecados. Muitos buscam uma espiritualidade que transforme o homem em deus. Quem não quer ouvir que é o máximo? Quem não quer alguém que ensine a receita para sua própria salvação? A humanidade busca uma espiritualidade que massageie seu ego e que levante sua autoestima. E quando for preciso falar sobre erros? Que seja bem sutil e genérico, sem dar "nome aos bois"

A diferença do Evangelho de Jesus Cristo é que ele não fala o que a humanidade quer ouvir, mas o que ela precisa ouvir. Reconheço que não é uma missão agradável ou mesmo fácil. Reconheço também que a maioria dos líderes cristãos realizaram um desserviço ao pregar um Deus tão severo que alimentou descrições simplistas e preconceituosas como a da repórter de Época. 

Contudo, é necessário continuar pregando sobre o pecado, e ainda mais sobre a graça de Deus. Falar aquilo que os homens precisam ouvir não significa ser desagradável, mas sim verdadeiros. Anunciar o que Jesus fez pela humanidade revelará que Deus é o verdadeiro Pai de Amor (e não Pream Baba). Mostraremos às pessoas que Deus não vive atrás de nossos pecados, pois eles já foram perdoados na cruz do Calvário. Se há algo que Ele procura, isso se chama Relacionamento. 

A questão é que relacionamento com Deus exige que sejamos francos e humildes. Exige reconhecer quem na verdade somos, com nossas falhas e capacidades. O amor de Deus realmente não é desinteressado; mas ao contrário do que pensa a repórter e muitos outros, ele não é interessado em nossa perfeição moral ou em nossos rituais religiosos, mas em nossa sinceridade e amor.

No dia em que a humanidade reconhecer o verdadeiro Pai de Amor, perceberá que ele não é um desocupado bisbilhoteiro, que com binóculos na mão fica a espiar a vida da pessoas. Mais do que espiar, ele deseja participar de nossas vidas como um verdadeiro guia e amigo.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Fé para além do milagre (Mateus 11)

Ontem experimentei um daqueles raros momentos em que Deus respondeu minhas indagações. Estava a refletir sobre a contradição da fé cristã no Brasil após a divulgação dos últimos resultados do censo realizado em 2010. Cresce o número de cristãos, porém, são escassos os sinais do Reino de Deus na sociedade. Como explicar isso? Porque a mensagem do Evangelho não impacta as estruturas decadentes de nosso país? Porque o aumento do número de religiosos não implica em mais discipulos de Cristo?

Sei que você que está lendo esse texto deve possui suas teorias quem respondem essas minhas "tolas" perguntas. Eu também tenho as minhas. Contudo, ontem durante a leitura de Mateus 11, senti como se Deus estivesse me ajudando a discernir essa situação. Para compreensão da minha breve reflexão, sugiro a leitura do texto bíblico.  

Este capítulo trata de João Batista e Jesus, e seus papeis na sociedade judaica do séc. I. João Batista queria saber se Jesus era o tão aguardado Messias que ele mesmo profetizou em seus ensinos à margem do Jordão. Jesus não responde com um simples "sim", mas convida João e os seus ouvintes a perceberem que suas ações já mostravam quem ele realmente era. Para Jesus, o que importa não é afirmar-se como Messias, mas viver e agir como o Messias. O mesmo vale para nós. Não basta dizer que é cristão, seus atos precisam estar alinhados com sua fala.

As dúvidas de João e seus contemporâneos quanto a Jesus nasceram dos mitos religiosos acerca do agir de Deus. Expectativas erradas cegam nosso entendimento para a percepção do que Deus realmente está fazendo.

Só assim é possivel entender as palavras de condenação de Jesus contra as cidade de Corazim, Betsaida e Carfanaum e todo o contexto do capítulo onze. Pois apesar das curas, das libertações de demônios e dos muitos outros sinais, não houve fé para além do milagre. Desconfio que esse é o mesmo mal do nosso cristianismo tupiniquim.

Não falo de outro tipo de fé, mas de um aprofundamento da fé que já existe. Jesus lamenta que mesmo com todos os sinais miraculosos e com o ensino do evangelho feito publicamente, não houve uma fé que transformasse o coração daquele povo. Existem um nivel de fé que pode curar as doenças do corpo, mas somente uma fé mais profunda pode curar as doenças da alma e do caráter.

O que isso tem haver com as minhas perguntas iniciais? Tudo haver! A fé cristã no Brasil cresce movida pela expectativa do milagre e da manipulação do divino, e no geral não passa disso. Tal constatação já extrapola os arraiais dos neopentecostais. Nosso país vive um cristianismo adoecido porque a fé do nosso povo ainda não aprofundou-se o bastante para transformar o caráter a tal ponto de nos tornarmos discípulos do Reino. Somos crentes ou católicos, mas dificilmente discípulos de Cristo.

Só que há muitos que "se acham" discípulos de Cristo, e isso porque alimentam expectativas erradas sobre Jesus. Convicções de fé são importantes e necessárias, mas se não forem constantemente revistas e atualizadas serão como véu que impede uma visão plena de Deus e de suas ações. Você já parou para pensar que seus conceitos de fé podem estar lhe impedindo de enxergar a Deus com mais profundidade?

Jesus nos ensina que a visão do Messias e do Reino de Deus está disponível não aos sabichões, mas aos simples. Estes não estão impedidos de reaprender e reavaliar e são capazes de discernir se as ações são coerentes com o discurso. Estes já não se sentem cansados e sobrecarregados com toda essa incoerência, mas vivem uma vida leve porque simplesmente decidiram aprender de Cristo com a mente aberta.

Que estes poucos possam crescer e invadir nossa religiosidade cristã, transformando-a em algo mais coerente com tudo aquilo que Jesus fez e ensinou. Esta é minha oração.


Jorge Luiz



quarta-feira, 27 de junho de 2012

Texto no site da Ultimato

Escrevi um texto publicado no site da Revista Ultimato, na área do leitor. Segue o link: http://www.ultimato.com.br/comunidade-conteudo/buscando-o-equilibrio-em-cristo

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Comentário sobre o livro Igreja Simples

Alguns amigos me consideram alguém totalmente decepcionado com a Igreja. Até certo ponto essa percepção está correta. Sou sim um cara profundamente decepcionado com muita coisa por aí que o pessoal chama de Igreja. Já me decepcionei com meus heróis e acabei enfadado com as estruturas, as propostas e os discursos. Soma-se a isso a belicosa polaridade teológica entre liberais e fundamentalistas que assistimos hoje e você acaba encontrando um caldeirão de coisa que te deixa realmente enojado com tudo.

Sou um decepcionado sim, mas não deixei de acreditar no chamado de Jesus para uma vida espiritual autentica. E por incrível que pareça, ainda acredito que a vida em comunidade de fé é um aspecto indispensável desta verdadeira espiritualidade. 

E por ainda acreditar foi que eu comprei e li o livro Igreja Simples, da Editora Palavra. Ora, nada mais convidativo para um frustrado como eu! (risos). 

De ante mão afirmo que o livro é bom, mas é preciso lê-lo com um olhar criterioso e seletivo. Como a maioria dos livros de autores estadunidenses, a proposta é vender "A" ideia que transformará definitivamente sua vida. Devido a uma pesquisa os autores conseguiram encontrar o "Verdadeiro DNA da Igreja" que há séculos estava escondido. E os números comprovam.

O livro está mais próximo de uma consultoria administrativa do que mesmo uma séria revisão eclesiológica, com base em rica exploração bíblica. Do contrário, as citações bíblicas são utilizadas apenas como ilustração da teoria administrativa. Em tempos de conhecimento bíblico raso, não é de se espantar.

Como disse, esse livro precisa ser lido de forma criteriosa, assim como quem come um peixe atento para não engolir espinha. E já que eu tirei um bocado de espinha, posso retirar aquilo que me alimentou.

O livro tem uma proposta de organização da Igreja em torno da ênfase do discipulado, e isso é ótimo. Contudo, a própria visão de discipulado dos autores é deficitária. Segundo eles, o discípulo deve conectar-se a Deus (geralmente isso está atrelado ao culto), conectar-se com os outros (participar de um pequeno grupo) e fazer discípulos (servindo num ministério da Igreja ou fazendo simplesmente proselitismo). 

O discipulado deve estar no centro da organização, da teologia e do discurso da Igreja, e isso é bíblico (Mt 28:18-20). A questão é que o discipulado de Jesus propõe que o amar a Deus é algo maior e mais profundo do que simplesmente comparecer à cerimonias religiosas. Consequentemente, amar ao próximo é muito mais do que participar de um grupo de afinidades, assim como fazer discípulos é algo muito maior do que uma adesão religiosa. A ideia do livro é boa, mas carece de uma reformulação mais bíblica sobre o que seria de fato um "discípulo".

Seguindo a argumentação, os autores mostram que, para se fazer uma Igreja Simples, é necessário haver quatro pontos essenciais para o planejamento e execução de suas atividades. A base consiste em:

Clareza - Movimento - Alinhamento - Foco

Clareza: é a capacidade de uma Igreja definir sua "filosofia de trabalho" de forma clara e simples. Quanto mais claro forem os processos, maior será a internalização por parte dos discípulos. Uma Igreja Simples tem uma declaração de missão curta e direta, simples de ser memorizada e repassada de forma fácil. 

Movimento: é a capacidade de conduzir as pessoas pelo processo. Aqui as atividades são ligadas ao processo. Por exemplo, se a primeira etapa do processo simples é amar a Deus, a atividade que deve estar ligada a esse princípio é o culto dominical. Não basta apenas associar uma atividade a um principio, é preciso conduzir as pessoas para que elas desejem participar das atividades como forma de crescer no processo.

Alinhamento: é a capacidade de alinhar a Igreja em torno desse processo. Nesse caso, a escolha dos lideres se dá não apenas pelos dons e talentos que ele revela, mas principalmente pelo seu comprometimento com o processo. Explicar e dirimir dúvidas quanto ao processo fazem parte do alinhamento.

Foco: é a capacidade de redirecionar toda a programação da Igreja para atender ao processo do discipulado. Aqui inclui eliminar atividades desnecessárias, reformular outras que possam ter afinidades com o processo, e acima de tudo, criar novas atividades somente quando for estritamente necessário.

Fica claro que a estrutura desenhada pelo livro é totalmente inspirada na ciência administrativa, e sinceramente não acho isso condenável. Na verdade, todo ajuntamento humano precisa ter essas qualidades. Contudo, a forma quase absolutizada com a qual esses aspectos são defendidos revelam que o modelo acaba por ser endeusado pelos membros. É muito perigoso, por exemplo, absolutizar o alinhamento e o foco, pois quando se faz isso, acabe-se sempre por atropelar as pessoas, desrespeitando suas individualidades. Não podemos esquecer que na Igreja de Jesus as pessoas são mais importantes do que os resultados.

Concordo que uma Igreja precisa ter clareza quanto a sua missão, formulando de maneira simples. da mesma forma, também acredito que a Igreja deve preocupar-se conduzir as pessoas pelo crescimento espiritual, mas sempre lembrando que tal missão não exclui o aspecto pessoal desta transformação.

Também penso que o alinhamento e foco é algo essencial. O próprio Cristo ensinou que um reino dividido não subsiste (Mt 12.25). Contudo, o foco não é no processo, mas nas pessoas; assim como o alinhamento não deve ser com o processo, mas entre pessoas que se alinham apesar das suas diferenças.

A impressão geral que fiquei ao terminar o livro foi essa: o processo acaba se impondo sobre as pessoas. Um pastor não guia suas ovelhas através de coleiras. Deve haver espaço para liberdade, para criatividade e para seguir novos rumos. Quando você entende que o processo deve ser mantido a todo custo, acaba por matando a criatividade das pessoas e passa por criar uma verdadeira aversão pelo novo.

Por fim, acho que há muitas dicas boas no livro. Ele pode contribuir sim para que venham surgir Igrejas simples, autênticas, íntegras. Os autores propõem acertadamente que as Igreja devem organizar cada aspecto de sua estrutura e organização de forma a atender melhor o chamado de discipular. No entanto não devemos absolutizar uma visão a ponto de torna-la mais importante do que as pessoas. Uma Igreja não vive pelo processo, mas vive por gente. 
 

terça-feira, 29 de maio de 2012

Você morreria por sua fé?

O cristianismo, ao ser odiado pelo mundo, mostra que não é obra de persuasão, mas de grandeza. (Inácio de Antioquia)


O que você sente ao ler essa frase?

Eu pessoalmente sinto tristeza com o Cristianismo fraco e diluído no qual vivemos. Me entristeço porque estamos destruindo tudo aquilo pelo qual os mártires do passado e do presente construíram com suor e sangue, muito sangue.

Chego a ficar desestimulado com tanta conversa fiada travestida de evangelho. O que chamam hoje de pregação em nada se compara com a autêntica mensagem pela qual pessoas entregavam a própria vida. Quem hoje iria para a morte com leões por defender a teologia da prosperidade, o teísmo aberto, ou mesmo o fundamentalismo irracional? Acredito que ninguém.

Na maioria dos casos a proposta é somente um "cristianismo light". Ou seja, queremos apenas ser prósperos e politicamente corretos. Uma fé que não exige renúncia, sofrimento e radicalidade. Estamos sob um relativismo que desmancha as bases que um dia foram firmadas com o sangue dos mártires que se entregaram a Cristo por terem despertado o ódio e a repulsa do mundo.

Por quais valores morreríamos? Pelo que vale a pena morrer? O que é inegociável para você a ponto de até mesmo entregar-se ao martírio? Eu tenho me perguntando isso ultimamente.

Sugiro a todos que são cristãos que conheçam e valorizem sua história. Talvez revisitando os nossos pais poderemos redescobrir quais são os valores que devemos guardar ao ponto de morrer por eles. Só assim descobriremos o que Inácio quis dizer com uma frase tão forte e tão verdadeira.

Que Deus tenha misericórdia de nós!

quinta-feira, 24 de maio de 2012

A Estrada

Somente agora consegui assistir o filme A Estrada, baseado no livro homônimo de Cormac McCarthy, e preciso registrar que o filme é maravilhoso.

O filme conta a história de um pai que vaga com seu filho em um mundo pós apocalíptico. Não há muitos sobreviventes, e destes, alguns andam em bandos; praticando o canibalismo comum em tempos desesperadores.

Vagando em busca da sobrevivência, a procura de restos de comida e roupas, o pai tenta ensinar ao filho sobre os valores que nos tornam humanos e nos distinguem daqueles que agem como animais. Essa é a principal reflexão que a história me traz: Como manter "o fogo interior acesso" diante de um cenário tão hostil?Como preservar a humanidade em meio a um mundo caótico e bestializado? 

Durante o filme o pai dá vários sinais de que já não consegue distinguir entre os caras bons e os maus. Ele passa a considerar qualquer um que cruze o caminho deles como um inimigo em potencial. Contudo, a doença e corpo magro do pai já indicam que ele está prestes a morrer, e que não conseguirá cumprir a promessa de chegar as praias do sul com seu filho, onde ele acredita ainda haver homens bons.

Mesmo agonizante, o pai não orienta o filho a se matar, como já havia feito em outros momentos do filme. Ele acredita na vida e crê que ensinou ao filho o necessário para que ele sobreviva. Consegue manter a esperança acessa mesmo diante de um cenário tão sombrio.

Só que o pai estava enganado em um ponto: não havia pessoas boas apenas no sul. Após sua morte, uma família sobrevivente, que seguia-os a distância, resolveu cuidar do menino agora órfão de pai e mãe. Mesmo ensinando seu filho sobre os valores humanos, ele já não conseguia perceber humanidade ao seu redor, e seu isolamento causou dores ao filho e até mesmo sua morte.

Ainda não vivemos num mundo como o que foi descrito no filme, mas de semelhante modo presenciamos dias em que temos dificuldades de distinguir entre humanos e animais. Num mundo recheado de redes sociais, vivemos cada vez mais isolados porque tememos o próximo. Mas como acreditar na vida se não enxergarmos que ao nosso lado ainda caminham pessoas de valor? Como ensinar um filho a ser bom sozinho? Se somos bons ou maus, isso sempre será em relação a alguém. Como ensinou o filósofo Martin Buber, não existe o eu sem o outro.

Como manter o fogo interior acesso? Segundo o filme, a receita é conhecer os valores humanos, preservar estes valores e exercê-los em relação ao outro, buscando enxergar humanidade além de nós mesmos. 

Ótimo filme, recomendo!

terça-feira, 15 de maio de 2012

Um Cristo Superior

Ontem tive o privilégio de dar uma aula sobre o livro de Hebreus para uma turma do seminário. Para bem da verdade, isso é uma das poucas coisas que me trazem satisfação e motivação.

Percebíamos, pela leitura do livro, que a temática central girava em torno da Superioridade de Cristo. Hebreus afirma que Cristo é superior aos Anjos, a Moisés, ao Sacerdócio Levítico, aos sacrifícios de animais e as leis do Antigo Testamento como um todo. Em vários trechos o autor afirma que a primeira aliança é inútil, pois é cópia e sombra de uma realidade eterna que se consumou na temporalidade pelo ministério de Jesus.

Em Jesus o nosso entendimento na fé passa a compreender a clareza da realidade eterna da redenção de forma que tornou obsoleta a Lei, que era uma sombra imperfeita do que haveria de vir.

Portanto, após as profundas reflexões que surgiram a partir de nossas aulas, foi-me inevitável perguntar: Precisamos hoje reafirmar a superioridade de Cristo?

O autor do Livro de Hebreus estava lidando com a questão da Apostasia, que era um problema bem presente. Precisamos entender que abraçar a fé cristã, na época em que este livro fora escrito, implicava em retaliações bem maiores do que as que sofremos hoje (se é que ainda sofremos retaliações de fato). Perder os bens e tornar-se um "marginalizado" era uma condição quase que comum (Hb 10.34). Em situações como essa, não eram raros os casos de cristãos que estavam retornando para o judaísmo como uma especie de "nova salvação", já que não somente o confisco dos bens, mas também o atraso na Parusia (a volta de Jesus) colocava a mensagem dos primeiros discípulos de Jesus em descrédito.

Sendo assim, é compreensível o trabalho do autor de Hebreus em reafirmar o valor de Cristo diante do Judaísmo e clamar por uma fé que veja o futuro com otimismo e esperança, apesar das frustrações do presente.

Vivemos hoje outro contexto e temos outras demandas. Contudo, acredito que ainda se faz urgente declarar a superioridade de Cristo nos nossos dias.

E no que Cristo precisa ser declarado como superior? Dentre tantas coisas, Cristo hoje precisa ser demonstrado como sendo superior a:


  • Nossa arrogância religiosa, pois as "regrinhas" das religiões tornaram-se tão forte quanto as leis judaicas que o autor de Hebreus tanto combateu. Elas obscureceram a graça e amor de Deus revelados em Jesus, o Cordeiro que foi morto antes de todas as coisas.


  • Nossa idolatria, seja ela por dinheiro, sexo, poder, consumo, felicidade e prosperidade. Se há um valor na vida que deveria ser perseguido, que este seja claramente a vida de fé que encontra em Cristo pleno sentido e satisfação.


Acredito que quem lê esse texto deverá pensar em outras questões que exigem a nossa declaração da superioridade de Jesus. Então passo a pergunta para você: no que Jesus precisa ser declarado superior?

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Ateísmo Equivocado

Por esses dias eu tive um debate com um colega de trabalho acerca do machismo na Bíblia. Durante a conversa, ele rapidamente listou uma série de versículos que, segundo os estudiosos do ateísmo, reforçam suas convicções de que a Bíblia aprova e estimula o machismo e a violência contra a mulher.

Tentei, com toda a mansidão, explicar-lhe que a Bíblia, igualmente a qualquer outro livro histórico, precisa ser interpretado a partir do contexto histórico. Foi então que uma outra pessoa interviu no debate afirmando que sempre utilizamos esse "papo de interpretação" para fugir daquilo que está bem claro.

Quando um debate escamba para esse tipo de desonestidade intelectual, fica difícil continuar qualquer reflexão construtiva. É tipico de muitos ateus e críticos da religião acusar-nos de utilizar textos bíblicos selecionados e interpretados ao próprio gosto para defendermos nosso ponto de vista. Contudo, não seria exatamente isso que a maioria dos ateus fazem? Quando listo vários versículos bíblicos que considero negativos, e acabo excluindo muito outros de boa qualidade, não estaria eu agindo da mesma maneira que os "religiosos fanáticos" que tanto critico?

A Bíblia é sim um livro que exige interpretação, pois se a lermos com nossas lentes pós-moderna simplesmente não a entenderemos, e a julgaremos mal. Não vejo ninguém lendo os textos de Nelson Rodrigues de forma literal, pois quem assim o faça julgará que esse autor é bem machista, já que as mulheres que descritas em suas crônicas são, na maioria, de moral bastante duvidosa. Sendo assim, acredito que as pessoas que leem Nelson Rodrigues o interpretam nos seus objetivos, já que dificilmente escuto alguém o chamando de machista e detrator de mulheres.

Estou fazendo essa comparação apenas para destacar que a Bíblia, assim como qualquer outra literatura, precisa ser interpretada respeitando o seu contexto. Afirmar que a Bíblia criou o machismo (e o mesmo vale para outros diversos males sociais) é no minimo um preconceito burro. Havia machismo, escravidão, roubo e mentiras muito antes de qualquer página bíblica ter sido escrita. O que poucos querem entender ou aceitar (isso vale para ateus e fundamentalistas), é que muitos textos bíblicos reproduzem alguns aspectos presentes na consciência social daquele tempo.

Entender que há textos bíblicos que estão mais alinhados com as convenções sociais do que com o real caráter de Deus não a torna menos sagrada ou menos valorosa. Pelo contrário, revela que ela é um escrito honesto e ao mesmo tempo fascinante. A Bíblia não esconde as falhas para agradar a ninguém, mas quer somente revelar a verdade para aquele que sinceramente a busca.

Jesus, que é a verdadeira chave de interpretação bíblica, sempre valorizou as mulheres. Haviam discípulas que lhe seguiram tão de perto que a primeira pessoa a testemunhar a ressurreição de Cristo foi Maria Madalena (Mateus 28:1-10; Marcos 16:1-5,10,11; Lucas 24:1-10). Se entendermos que no tempo de Jesus o testemunho de uma mulher era desconsiderado pelo simples fato de ser mulher, percebemos que, ao se revelar ressuscitado para as mulheres, Ele reafirmava todas as mulheres no seu valor.

O mesmo podemos dizer com a respeito do episódio da mulher adúltera (João 8.3-11). Esta seria apedrejada de forma intencionalmente machista, pois a lei afirmava que o casal adultero é que deveria ser julgado. Jesus a salva mostrando que o pecado está para além da questão do gênero, e que a graça estendida ao adultero deve ser a mesma oferecida a adultera.

É uma pena que textos como esses nunca são considerados pelos que querem apenas ridicularizar a religião dos outros. Aos que desejam aprender som honestidade e sem preconceito, sugiro uma leitura dos evangelhos, para que você interprete quem é Jesus, pois somente a partir de Jesus é que as Escrituras Sagradas revelam sua real mensagem.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Espiritualidade Relevante



"Grite alto, não se contenha! Levante a voz como trombeta. Anuncie ao meu povo a rebelião dele, e à comunidade de Jacó, os seus pecados.
Pois dia a dia me procuram; parecem desejosos de conhecer os meus caminhos, como se fossem uma nação que faz o que é direito e que não abandonou os mandamentos do seu Deus. Pedem-me decisões justas e parecem desejosos de que Deus se aproxime deles.
‘Por que jejuamos’, dizem, ‘e não o viste? Por que nos humilhamos, e não reparaste? ’ Contudo, no dia do seu jejum vocês fazem o que é do agrado de vocês, e exploram os seus empregados.
Seu jejum termina em discussão e rixa, e em brigas de socos brutais. Vocês não podem jejuar como fazem hoje e esperar que a sua voz seja ouvida no alto.
Será esse o jejum que escolhi, que apenas um dia o homem se humilhe, incline a cabeça como o junco e se deite sobre pano de saco e cinzas? É isso que vocês chamam jejum, um dia aceitável ao Senhor?
"O jejum que desejo não é este: soltar as correntes da injustiça, desatar as cordas do jugo, pôr em liberdade os oprimidos e romper todo jugo?
Não é partilhar sua comida com o faminto, abrigar o pobre desamparado, vestir o nu que você encontrou, e não recusar ajuda ao próximo?
Aí sim, a sua luz irromperá como a alvorada, e prontamente surgirá a sua cura; a sua retidão irá adiante de você, e a glória do Senhor estará na sua retaguarda.
Aí sim, você clamará ao Senhor, e ele responderá; você gritará por socorro, e ele dirá: Aqui estou. "Se você eliminar do seu meio o jugo opressor, o dedo acusador e a falsidade do falar;
se com renúncia própria você beneficiar os famintos e satisfizer o anseio dos aflitos, então a sua luz despontará nas trevas, e a sua noite será como o meio-dia.
O Senhor o guiará constantemente; satisfará os seus desejos numa terra ressequida pelo sol e fortalecerá os seus ossos. Você será como um jardim bem regado, como uma fonte cujas águas nunca faltam.
Seu povo reconstruirá as velhas ruínas e restaurará os alicerces antigos; você será chamado reparador de muros, restaurador de ruas e moradias.
"Se você vigiar seus pés para não profanar o sábado e para não fazer o que bem quiser em meu santo dia; se você chamar delícia o sábado e honroso o santo dia do Senhor, e se honrá-lo, deixando de seguir seu próprio caminho, de fazer o que bem quiser e de falar futilidades,
então você terá no Senhor a sua alegria, e eu farei com que você cavalgue nos altos da terra e se banqueteie com a herança de Jacó, seu pai. " Pois é o Senhor quem fala.
Isaías 58:1-14


Não acredito que este seja um texto fácil de ler. Por inúmeros motivos a comunidade cristã, num contexto geral, não consegue captar a essência do que foi falado. Não posso listar todos, mas gostaria de destacar um dos motivos que penso ser o principal:

Nossa liturgia, nossas demandas religiosas, nossa programação, nada disso faz sentido em si mesmo. Isaías nos ensina que se a nossa religião não caminhar na busca da promoção da dignidade da vida humana, em todas as suas dimensões, ela não passará de uma devoção vazia.

É difícil ler isso porque gastamos tanta energia, tanto dinheiro, tantas palavras em nossos cultos e atividades que consideramos “sagradas” e esquecemos as reais demandas que estão no centro da espiritualidade cristã. Para abalizar esta prática perversa, há um pensamento teologizado que dicotomiza fé e obras, e principalmente os evangélicos adoram citá-lo como forma de anestesiar a consciência: Obras não salvam!

Ora, quando Paulo ensinou que a salvação vem pela fé e não por obras, a sua intenção era enfatizar que o legalismo inerente aos mandamentos judaicos tornaram-se descartáveis diante do que Jesus realizou na cruz e na ressurreição. Contudo, Paulo nunca rejeitou o tipo de obra que Isaías e Tiago defenderam.

Porém, hoje vivemos justamente o legalismo e a prática de obras das quais Paulo condenou. Quando colocamos nossa liturgia e nossas “santas tradições” acima das necessidades humanas, estamos caindo no mesmo erro dos antigos judeus e passamos a viver pela lei como meio de uma salvação egocêntrica. Contudo, quem vive na graça deve aprender que a sua existência precisa ser um canal de salvação e consolo para todos.

É isso que Deus diz através do profeta Isaías:

Será esse o jejum que escolhi, que apenas um dia o homem se humilhe, incline a cabeça como o junco e se deite sobre pano de saco e cinzas? É isso que vocês chamam jejum, um dia aceitável ao Senhor?

Podemos então nos perguntar: Será que a vida cristã se resume a isso? Será que o Jejum é apenas a prática de abster-se de alimento? Se for isso, então apenas passamos fome. E a oração? é apenas “verborragia”? se for, então apenas “gastamos o nosso latim”.

E a partir desses questionamentos, começaremos a entender que Deus nos convida a uma prática devocional válida e que nos direciona a favor do oprimido, do necessitado e do injustiçado. Só então deixaremos de nos esconder em teologias distorcidas e viveremos uma missão que realmente vale a pena:

Seu povo reconstruirá as velhas ruínas e restaurará os alicerces antigos; você será chamado reparador de muros, restaurador de ruas e moradias.

Não há meio termo: se não agirmos, com certeza nos tornaremos promotores da injustiça, ainda que seja pela via da omissão. Oração e Jejum sozinhos, sem ações dignas de um servo de Deus, são apenas sacrifícios vãos.

Pois é, como eu disse, oh texto difícil esse de Isaias 58! Pior do que lê-lo é vivê-lo.

Que o Senhor nos ajude.

Amém!

sexta-feira, 16 de março de 2012

Vasos de Barro


Mas temos esse tesouro em vasos de barro, para mostrar que este poder que a tudo excede provém de Deus, e não de nós.
2 Coríntios 4:7.



No tempo do Apóstolo Paulo os utensílios domésticos das pessoas mais simples (leia-se pobres) eram feitos a base de barro cozido. Já os mais abastardos utilizavam vasilhas de cobre e até mesmo ouro puro.

Os vasos de barro eram utensílios sem valor nenhum e relativamente frágeis. Não raro era preciso reformar tais utensílios, pois com o uso constante, acabavam criando rachaduras que inviabilizavam sua utilização.

Portanto, quando o apóstolo afirma que somos vasos de barro, ele está dizendo que a verdadeira revelação da mensagem do evangelho habita entre os humildes, entre aqueles que entenderam que em si mesmos não possuem valor algum que faça merecer o amor de Deus e o Seu favor para conosco.

A diferença entre um vaso de ouro e o vaso de barro é que o ultimo não chama atenção e não tem brilho próprio, pois é simples.

Pense nisso!

Jorge Luiz