quarta-feira, 25 de abril de 2012

Espiritualidade Relevante



"Grite alto, não se contenha! Levante a voz como trombeta. Anuncie ao meu povo a rebelião dele, e à comunidade de Jacó, os seus pecados.
Pois dia a dia me procuram; parecem desejosos de conhecer os meus caminhos, como se fossem uma nação que faz o que é direito e que não abandonou os mandamentos do seu Deus. Pedem-me decisões justas e parecem desejosos de que Deus se aproxime deles.
‘Por que jejuamos’, dizem, ‘e não o viste? Por que nos humilhamos, e não reparaste? ’ Contudo, no dia do seu jejum vocês fazem o que é do agrado de vocês, e exploram os seus empregados.
Seu jejum termina em discussão e rixa, e em brigas de socos brutais. Vocês não podem jejuar como fazem hoje e esperar que a sua voz seja ouvida no alto.
Será esse o jejum que escolhi, que apenas um dia o homem se humilhe, incline a cabeça como o junco e se deite sobre pano de saco e cinzas? É isso que vocês chamam jejum, um dia aceitável ao Senhor?
"O jejum que desejo não é este: soltar as correntes da injustiça, desatar as cordas do jugo, pôr em liberdade os oprimidos e romper todo jugo?
Não é partilhar sua comida com o faminto, abrigar o pobre desamparado, vestir o nu que você encontrou, e não recusar ajuda ao próximo?
Aí sim, a sua luz irromperá como a alvorada, e prontamente surgirá a sua cura; a sua retidão irá adiante de você, e a glória do Senhor estará na sua retaguarda.
Aí sim, você clamará ao Senhor, e ele responderá; você gritará por socorro, e ele dirá: Aqui estou. "Se você eliminar do seu meio o jugo opressor, o dedo acusador e a falsidade do falar;
se com renúncia própria você beneficiar os famintos e satisfizer o anseio dos aflitos, então a sua luz despontará nas trevas, e a sua noite será como o meio-dia.
O Senhor o guiará constantemente; satisfará os seus desejos numa terra ressequida pelo sol e fortalecerá os seus ossos. Você será como um jardim bem regado, como uma fonte cujas águas nunca faltam.
Seu povo reconstruirá as velhas ruínas e restaurará os alicerces antigos; você será chamado reparador de muros, restaurador de ruas e moradias.
"Se você vigiar seus pés para não profanar o sábado e para não fazer o que bem quiser em meu santo dia; se você chamar delícia o sábado e honroso o santo dia do Senhor, e se honrá-lo, deixando de seguir seu próprio caminho, de fazer o que bem quiser e de falar futilidades,
então você terá no Senhor a sua alegria, e eu farei com que você cavalgue nos altos da terra e se banqueteie com a herança de Jacó, seu pai. " Pois é o Senhor quem fala.
Isaías 58:1-14


Não acredito que este seja um texto fácil de ler. Por inúmeros motivos a comunidade cristã, num contexto geral, não consegue captar a essência do que foi falado. Não posso listar todos, mas gostaria de destacar um dos motivos que penso ser o principal:

Nossa liturgia, nossas demandas religiosas, nossa programação, nada disso faz sentido em si mesmo. Isaías nos ensina que se a nossa religião não caminhar na busca da promoção da dignidade da vida humana, em todas as suas dimensões, ela não passará de uma devoção vazia.

É difícil ler isso porque gastamos tanta energia, tanto dinheiro, tantas palavras em nossos cultos e atividades que consideramos “sagradas” e esquecemos as reais demandas que estão no centro da espiritualidade cristã. Para abalizar esta prática perversa, há um pensamento teologizado que dicotomiza fé e obras, e principalmente os evangélicos adoram citá-lo como forma de anestesiar a consciência: Obras não salvam!

Ora, quando Paulo ensinou que a salvação vem pela fé e não por obras, a sua intenção era enfatizar que o legalismo inerente aos mandamentos judaicos tornaram-se descartáveis diante do que Jesus realizou na cruz e na ressurreição. Contudo, Paulo nunca rejeitou o tipo de obra que Isaías e Tiago defenderam.

Porém, hoje vivemos justamente o legalismo e a prática de obras das quais Paulo condenou. Quando colocamos nossa liturgia e nossas “santas tradições” acima das necessidades humanas, estamos caindo no mesmo erro dos antigos judeus e passamos a viver pela lei como meio de uma salvação egocêntrica. Contudo, quem vive na graça deve aprender que a sua existência precisa ser um canal de salvação e consolo para todos.

É isso que Deus diz através do profeta Isaías:

Será esse o jejum que escolhi, que apenas um dia o homem se humilhe, incline a cabeça como o junco e se deite sobre pano de saco e cinzas? É isso que vocês chamam jejum, um dia aceitável ao Senhor?

Podemos então nos perguntar: Será que a vida cristã se resume a isso? Será que o Jejum é apenas a prática de abster-se de alimento? Se for isso, então apenas passamos fome. E a oração? é apenas “verborragia”? se for, então apenas “gastamos o nosso latim”.

E a partir desses questionamentos, começaremos a entender que Deus nos convida a uma prática devocional válida e que nos direciona a favor do oprimido, do necessitado e do injustiçado. Só então deixaremos de nos esconder em teologias distorcidas e viveremos uma missão que realmente vale a pena:

Seu povo reconstruirá as velhas ruínas e restaurará os alicerces antigos; você será chamado reparador de muros, restaurador de ruas e moradias.

Não há meio termo: se não agirmos, com certeza nos tornaremos promotores da injustiça, ainda que seja pela via da omissão. Oração e Jejum sozinhos, sem ações dignas de um servo de Deus, são apenas sacrifícios vãos.

Pois é, como eu disse, oh texto difícil esse de Isaias 58! Pior do que lê-lo é vivê-lo.

Que o Senhor nos ajude.

Amém!